quarta-feira, 6 de junho de 2012

Somatização




Palavra pouco valorizada na época de nossa formação acadêmica nos anos de 1960 e 1970, teve uma conotação muito mais importante nas últimas décadas.  A somatização pode significar manifestações com sintomas, levando até a lesões no organismo, provenientes  de conflitos emocionais. Quando atendíamos um paciente naquela época, toda nossa investigação era na busca incessante de patologias que sempre se enquadrassem em causas de origem orgânica. Os pacientes que não se amoldassem nesse mapa, com certeza eram rotulados de “neuróticos”, que não mereciam muita atenção.
Outro conceito na nossa formação era de que as habilidades adquiridas no curso médico seriam para aplicação em toda a carreira, no  resto de nossa vida profissional.Tudo bem, tínhamos que acompanhar congressos que nos atualizassem, assinar  revistas que nos trouxessem  novas informações, mas os mais caros e melhores  periódicos  só chegavam  nas mãos dos  estudantes e médicos residentes depois que fossem bem curtidos pelo alto staff de qualquer serviço, meses depois de sua publicação.
Com o advento da internet, as coisas tomaram outro rumo. O conhecimento renovável deixou de ser prioridade de poucos, os acessos foram democratizados com o ciberespaço e os novos conhecimentos rapidamente usufruídos por todos. Por outro lado, as faculdades de Medicina aceitaram os ensinamentos de Paulo Freire, “aprender a aprender”, a pensar mais, “aprendendo a vida toda”, refletindo sobre os conceitos transmitidos no passado.
Ganhou o ser humano, lucrou o paciente, jamais abandonando uma investigação clínica adequada e moderna no seu enfoque, mas com o devido respeito à pessoa que nos procurava. Passamos a entender que o antigo “neurótico” era o que mais exigia a nossa atenção, carinho e dedicação, que  somatizava muito suas dificuldades emocionais  e que passamos a nos valer,  após o  devido cuidado holístico ao paciente,  do encaminhamento  para os profissionais da área mais envolvidos com as suas  verdadeiras causas.
Mas se os novos conceitos chegaram aos consultórios particulares, estão muito longe ainda de beneficiar todas as classes sociais em atendimentos públicos, justamente aqueles com as maiores problemáticas sociais. Conclui-se que no Brasil há uma medicina de ponta para as categorias economicamente diferenciadas e outra realidade, bem distante, destituída dos benefícios que a primeira usufrui, somatizando bem mais os seus conflitos.

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